12 de maio de 2022

Offline

 

Naquela manhã de domingo tudo parecia tão claro, e tudo estava no mesmo lugar, tudo mesmo, até ela, que continuava a escrever tentando buscar algum sentido que a salvasse de si mesma.

Mãos tremulas e cansadas, mas o cigarro não sairia dos dedos até que tragasse a última nicotina. Até que o silêncio fosse apenas o silencio e ouvisse apenas a sua respiração, palpitante. Parece que a dor no peito só aumenta, é um batuque além da alma, dentro de não sei onde, que só se ouve a cachoeira descendo sem cessar. 

Naquela manhã de domingo, olhou pela milésima vez se o café borbulhava no fogo, se ainda tinha cigarros na gaveta, e se a vida ainda estava quente, e admirou pela última vez a vida imaginária que não foi capaz de aliviar sua dor, seu sofrimento, sua angústia, sua inquietação, sua falta de ar.

O copo vazio sobre a mesinha, marca de batom nas bordas, madrugada tinha sido exausta, insonia, irritabilidade, suores e lágrimas, fobias, amores atemporais, gim, e paixões perdidas e abstratas, agora sozinha, solidão vestida de transparecia, que transparecia a alma  sem corpo, sem pressa, sem pena de si mesma, sem relógio, apenas em busca de um refúgio, um barulho de cachoeira caindo, ainda lhe chama a ouvir no meio do silencio.

Naquela manhã de domingo, tudo estava decidido, o jardineiro, aquele velho amigo, tinha sido demitido.

As cinzas do cigarro sobre a mesa, os olhos decididos a se fecharem, a  guerra que procura a paz dentro de si, do medo, do sim e do não, e o de não resistir e desistir.

A loucura em si, de um lado os sonhos e do outro a realidade, paralelepípedo,  precipitação, precipício,  paralelos, vida da ilusão de outra vida,  onde não se sabe o que é real e o que é fantasia.

Ela quis estar offline por um tempo, e foi de encontro com a cachoeira.

Ninguém sabe, mas ela sabia a inquietação que de dentro emergia.

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